
O primeiro dia útil de 2014 em Teofilândia (BA), foi marcado por um
misto de alegria, arrependimento, sonho, medo e clamor por mais
segurança. Tudo por conta do bilhete premiado, que foi pago a um grupo
de 22 pessoas que trabalha no Hospital Municipal Waldemar Ferreira de
Araújo e investiu R$ 100 no bolão. Agora, cada um deve receber pouco
mais de R$ 2 milhões. Os vencedores são duas cozinheiras, quatro
funcionárias da limpeza, cinco motoristas, cinco técnicas de enfermagem,
três vigilantes, uma enfermeira, uma recepcionista e um diretor.
Um dos amigos dos ganhadores disse que seu nome era um dos primeiros
da lista do bolão, mas acabou excluído por não ter pago sua parte no dia
da aposta.
— O organizador resolveu adiantar a aposta e como eu viajei e acabei
não pagando, meu nome foi retirado da lista. Não era pra ser — disse o
funcionário, que não quis se identificar.
Melhor sorte teve o diretor Valdemir de Assis, 43 anos, casado, quatro filhos:
— Resolvi participar pela primeira vez e dei sorte. Mas não mudará
muita coisa em minha vida, afinal minha família é muito grande e pobre,
assim como a de minha esposa.
Quando recebeu a notícia dos colegas, Valdemir disse ter ficado
“sereno”. Na virada do ano, “como sempre faço, abri um espumante e
brindei com minha esposa”. Ele não quis entrar em detalhes sobre o
salário que recebe, mas disse que o prêmio vai melhorar um pouco a
qualidade de vida da família:
— Sairei do aluguel mensal de R$ 500, mas continuarei trabalhando.
Uma das vencedoras, Maria Lúcia deixou a cidade na noite de
quarta-feira. Há mais de 20 anos, ela trabalhava no hospital. No quintal
da casa de estrutura muito precária, apenas uma cadela, um cachorro e
algumas galinhas ciscando. Vizinha de Maria Lúcia, Marivalda Andrada
disse que a viu chorando na tarde do dia 1º:
— Achei que foi de emoção. E, por volta das 22h, um carro parou em
sua porta, pegaram algumas coisas e ela partiu. Acho que perdi uma
amiga, mas estou muito feliz pela sua conquista.
Na cidade, o prêmio de Maria Lúcia foi visto como a mais merecido.
— Ela é muito pobre e sofredora. Mãe de 10 filhos, sendo dois
deficientes físicos. Tinha dia que, por falta de dinheiro, ela andava
até o trabalho. São mais de 9km. Deus foi muito justo com ela. Estou
muito feliz — disse Ademilson Ramos.
Na casa de uma das filhas de Maria Lúcia, Junior, genro da vencedora, pediu que a equipe de reportagem fosse embora:
— Não se brinca com dinheiro, aqui é uma cidade sem nenhuma segurança, e vocês da imprensa vão acabar cavando a nossa sepultura.
A preocupação com a segurança não é à toa. Segundo o delegado Getulio Queiroz, na cidade existe “dificuldade de pessoal”.
— Trabalho com apenas dois agentes e um escrivão — contou Queiroz,
lembrando que a a Polícia Militar trabalha com oito homens e em regime
de revezamento: — Só mesmo com a ajuda de Deus.
Motorista do hospital, Antônio Matos disse conhecer todos os vencedores:
— Nenhum veio trabalhar. Eles não estão preocupados com demissão.
Matos é evangélico e não joga. Mas acredita que será beneficiado,
pois um dos ganhadores, além de ser motorista, é vereador (PDT). Matos é
seu suplente.
Dono da lotérica onde a aposta foi feita, Antônio Ramos lembra que
teve o estabelecimento assaltado duas vezes — no último assalto, ele foi
baleado no ombro — e que a casa também foi arrombada. Para ele, o
prêmio pode servir para reforçar a segurança na cidade:
— Estava me programando para mudar de atividade. Agora, com essa
verba circulando no município, o prefeito terá mais força para
reivindicar proteção.
Com informações de O Globo/Foto: Agência A Tarde